Notícias - Violência DomésticaSeminário traça evolução do combate à violência doméstica no Brasil e discute desafios que ainda precisam ser superados
Durante o encontro, o secretário estadual de Justiça e Segurança Pública, Rogério Greco, e o procurador-geral de Justiça Adjunto Institucional, Hugo Moura de Barros, assinaram termo de cooperação lançando o Grupo de Intervenção Estratégica de Enfrentamento à Violência Doméstica (GIE-VD). O grupo irá selecionar alvos prioritários - em geral, agressores reincidentes - para que sejam monitorados pelas inteligências dos órgãos e pelas forças de segurança.
O sistema de Justiça precisa de protocolos adequados e cooperação entre instituições para fazer valer as conquistas dos movimentos sociais no enfrentamento à violência contra a mulher. A premissa foi uma das tônicas do seminário “A Evolução do Combate à Violência Doméstica no Brasil”, promovido pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf), em parceria com o Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (CAOVD) e a Coordenadoria Estadual das Promotorias de Justiça do Tribunal do Júri (Cojur).
No evento, realizado no Salão Vermelho da Procuradoria-Geral de Justiça, pesquisadores do tema trouxeram o histórico das leis que tratam do assunto e traçaram desafios que ainda precisam ser superados.
Durante o encontro, o secretário estadual de Justiça e Segurança Pública, Rogério Greco, e o procurador-geral de Justiça Adjunto Institucional, Hugo Moura de Barros, assinaram termo de cooperação lançando o Grupo de Intervenção Estratégica de Enfrentamento à Violência Doméstica (GIE-VD). O grupo irá selecionar alvos prioritários - em geral, agressores reincidentes - para que sejam monitorados pelas inteligências dos órgãos e pelas forças de segurança.
A subsecretária de Prevenção à Criminalidade da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), comentou sobre a iniciativa, inspirada no programa Fica Vivo. “Nós vamos trazer essa mesma expertise, essa montagem de ter todos os atores, as forças tradicionais de segurança, o Ministério Público, o Tribunal de Justiça e também a prevenção social, pensando no monitoramento e execução de alvos perigosos. Assim, a gente consegue operar de uma forma mais célere e fazer operações integradas de segurança para trazer mais segurança para as mulheres de Minas”, explicou.
Mobilizando o arcabouço conceitual do direito feminista, a professora da Universidade de São Paulo (USP) Fabiana Severi apresentou estatísticas de ações judiciais envolvendo violência doméstica no Brasil e fez um chamado a uma reforma das instituições de Justiça, especialmente na ponta, onde a população está mais próxima. Isso é possível, de acordo com a professora, a partir da incorporação da agenda de gênero às práticas cotidianas do sistema.
Para ilustrar, Severi mostrou o histórico de implantação de protocolos de julgamento com perspectiva de gênero nos tribunais da América Latina. A professora defendeu que as instituições da Justiça coloquem em prática o atendimento humanizado que evite a revitimização, ou seja, que não promova o sentimento de culpa na mulher agredida.
A coordenadora do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (CAOVD) do MPMG, Denise Guerzoni, reforçou a importância dos protocolos. Lembrando sua atuação como promotora de Justiça do Tribunal do Júri, Guerzoni acrescentou que somente novas leis não farão sentido se as instituições não construírem uma atuação condizente com as expectativas da sociedade civil. “O avanço legislativo é muito bem-vindo e decorre do próprio movimento social. Mas é preciso que as ferramentas da justiça, seja por meio das decisões judiciais, seja por meio da atuação do Ministério Público, tragam essa atualização e esse movimento de colocar a vítima como centro do processo penal contemporâneo”, comentou a promotora.
O promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e professor de Direito do Centro Universitário de Brasília (Ceub) Antônio Suxberger abordou a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que obriga a aplicação da lei Maria da Penha para casos de violência doméstica e familiar contra meninas e adolescentes.
Com a decisão, em caso de conflito entre a Lei Maria da Penha e o Estatuto da Criança e do Adolescente, os instrumentos jurídicos de gênero prevalecem. Há também decisões que obrigam a tramitação de casos judiciais envolvendo crianças e adolescentes nas varas criminais especializadas em violência doméstica contra a mulher. Isso ocorre especialmente após a aprovação da Lei Henry Borel, de 2022, que estabelece a possibilidade de medidas protetivas em favor de adolescentes e crianças, a exemplo do que a Lei Maria da Penha instituiu para mulheres.
De acordo com o professor, para um atendimento justo às necessidades das vítimas, é necessário um plano de implantação da Lei Henry Borel, com construção de protocolos, orçamento garantido, parcerias entre instituições, ampliação da capacidade dos profissionais envolvidos e fortalecimento da participação da comunidade.
Descompasso no enfrentamento à violência doméstica
No início da tarde, a promotora de Justiça Carol Reis Lucas Vieira da Ros, do Ministério Público de São Paulo, ministrou palestra sobre o novo tipo penal do feminicídio e sua abordagem em plenário. O promotor de Justiça Cláudio Maia de Barros, responsável pela Coordenadoria Estadual das Promotorias de Justiça do Tribunal do Júri (Cojur), atuou como debatedor.
Carol iniciou sua fala lamentando que, atualmente, no país, o que movimenta o Tribunal do Júri são os crimes de feminicídio. “De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o Brasil registrou cerca de 1.400 feminicídios no ano passado”, informou.
A promotora de Justiça destacou que existe, no país, um descompasso no enfrentamento à violência doméstica. “Houve uma mudança substancial no crime de feminicídio, com o aumento, por exemplo, da pena de 12 a 30 anos de reclusão para 20 a 40 anos. No entanto, essa mudança não foi acompanhada em relação aos crimes que o antecederam, como a ameaça e a lesão corporal”.
O que se observa como consequência disso, segundo ela, é o menor rigor na Justiça em relação às penas fixadas pela prática desses delitos e, consequentemente, o empoderamento dos agentes. “Não acho que aumentar a pena do feminicídio vai solucionar o problema”, avaliou.
Na sequência, ela comentou também sobre estratégias que têm sido usadas pela defesa dos réus para conseguir a absolvição dos agressores ou desclassificar o crime. Lembrou também lembrou da importância de os promotores e promotoras de Justiça conhecerem bem a mentalidade da sociedade e dos jurados para abordar, da melhor maneira, o tema da violência doméstica e obter o máximo de proteção para as mulheres.
Na sequência, a juíza do 1º Juizado de Violência Doméstica de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Madgéli Frantz Machado, abordou o tema “O Protocolo para julgamento com perspectiva de gênero e o acesso das mulheres à Justiça”. O coordenador pedagógico do Ceaf, promotor de Justiça Leonardo Barreto Moreira Alves, participou como debatedor.
Antes de discorrer sobre o Protocolo, Madgéli elencou as principais normas nacionais, internacionais e regionais de proteção dos direitos das mulheres. Ela destacou os obstáculos e restrições enfrentados pelas mulheres no sistema de Justiça e a cotidiana reprodução de estereótipos de gênero em leis, decisões e práticas nos fóruns e tribunais. “Precisamos trabalhar muito e de forma muito potente todos os atores do sistema de Justiça”, pontuou.
A partir dos ensinamentos da pesquisadora mexicana Cecilia Palomo Caudillo, a juíza explicou que julgar com uma perspectiva de gênero não significa dar sempre e em todas as circunstâncias o direito às mulheres. “Significa identificar os fatores estruturais que geram desvantagens políticas, econômicas e estruturais para as mulheres, impedindo-as de alcançar a igualdade substantiva de direitos”, pontuou.
No final do evento, foi apresentada, pelo procurador de Justiça do MPMG Eduardo Machado, a proposta piloto de Clínica de Estudos em Violência Doméstica.
Tótens
Ao longo do encontro, tótens instalados fora do Salão Vermelho exibiram vídeo da Campanha “Até que a morte nos separe. A violência doméstica não tem que ser para sempre”, produzida pela Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (Apav), com o apoio do MPMG.
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Ministério Público de Minas Gerais
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